Maicon Fábio Appelt é Engenheiro Agrônomo, possui mestrado na área de Produção Vegetal pela Universidade Federal de Viçosa e especialização em Nutrição de Ruminantes pela FAZU. Atua nas áreas de pastagem, forragicultura, fertilidade do solo e recursos hídricos, com ênfase em fertirrigação e uso de águas residuárias. Atualmente é projetista, consultor e doutorando em tecnologia ambiental pela Universidade de Ribeirão Preto – SP.

O Brasil, possui características edafoclimáticas muito favoráveis para a produção animal, uma vez que possui clima tropical e extensas áreas de terras ocupadas com pastagens. Dados divulgados pelo IBGE (2010) demonstram que o rebanho bovino brasileiro aumentou de 158,3 para 205,9 milhões de cabeças, enquanto a área total de pastagens diminuiu de 177,7 para 158,6 milhões de hectares entre os anos de 1996 a 2006. A pastagem é a principal fonte de alimento dos ruminantes e é certo que o aumento de produção de forragem é fator fundamental ao sucesso da atividade. Dessa forma, a intensificação do sistema de produção, com uso racional do solo, ambiente, planta e animal é o meio mais eficaz de atingir altos patamares de produção (ALVES et al., 2008).

Visando minimizar a variação da oferta de forragem disponível, se pensa em irrigação de pastagem, porém, é fundamental que o produtor esteja ciente de que o projeto somente terá sucesso se acompanhado de um conjunto de fatores, que juntamente com a irrigação, proporcionarão aumento da produção de forragem. Ainda, para que o aumento da produção vegetal seja transformado em retorno econômico, é necessário que a forragem produzida seja colhida e transformada com eficiência em produto animal.

É importante destacar que investir em intensificação do sistema produtivo está aquém de somente suprir a demanda hidráulica, mas de estar apto e seguir critério muito refinados de manejo da pastagem, adubação, escolha de uma forragem que garanta boa resposta produtiva ao sistema, estudo e acompanhamento da produção de foragem ao longo do ano, bom sistema rotacionado e disponibilidade de água para os animais.

Na Figura 1 pode-se observar uma propriedade rural onde se trabalha com sistema de irrigação e ocorre o controle de todos os fatores supracitados. Vale destacar que ter um sistema de irrigação instalado na propriedade e não explorar o potencial produtivo da área irrigada (com manejo e adubação) pode ser um erro grave dentro desse sistema de produção.

Figura 1 - Propriedade rural localizada no MS e que trabalha com sistema de irrigação de Tifton 85 e adota bons critérios de manejo da pastagem e dos animais.

Uma das grandes preocupações do setor produtivo animal baseia-se na estacionalidade de produção das forrageiras, que ocorre devido à má distribuição das chuvas, déficit de temperatura e luminosidade, fatores essenciais ao desenvolvimento dessas plantas. Em um primeiro momento, a avaliação da viabilidade de irrigação de pastagens nas diferentes regiões brasileiras deve levar em consideração as características do clima, principalmente em termos de temperatura e precipitação pluvial. Para haver resposta satisfatória à irrigação e adubação é necessário que a temperatura seja satisfatória ao crescimento da espécie forrageira de interesse (APPELT, 2005). 

Além do clima, outros fatores devem ser levados em consideração: quantidade de água disponível, espécie forrageira utilizada, tipo de solo, topografia, disponibilidade e distância de água e energia elétrica, eficiência produtiva, valor da terra, disponibilidade de mão de obra, mercado para compra e venda de animais, etc. Os principais são detalhados nos tópicos a seguir.

a) Quantidade de água necessária:

Esse é um dos questionamentos básicos de todo empresário rural quando almeja iniciar a viabilidade de instalação de um sistema de irrigação para pastagem. Em geral a conta deve ser realizada com base nas perdas diárias de água que o sistema solo/planta vai apresentar. Tal medida é estimada pela evapotranspiração (ETP), que, em síntese, é a somatória das perdas de água por evaporação do solo e transpiração das plantas. Esse valor varia ao longo do ano e também depende da região, porém pode ser obtido através de dados climatológicos históricos. Levando em conta que a ETP média de uma determinada região é 4,5 mm por dia, podemos realizar o seguinte cálculo:

* Necessidade de água: 4,5 mm/dia

* Considerando que 1 mm é o mesmo que 1 L/m², temos que 4,5 mm é igual a 45 m³/ha. Essa seria a quantidade de água necessária para irrigar 1 hectare ao dia.

Dividindo os 45 m³ de água por um tempo de bombeamento de 21 h, temos que a vazão demandada por hectare é de 2,14 m³/h.

Para que o leitor tenho mais clareza, podemos considerar que uma fonte de água com vazão captável de 1 litro por segundo, seria suficiente para irrigar 1 hectare.

b) Espécie forrageira

A escolha da espécie forrageira ideal é um dos fatores essenciais ao sucesso da atividade, 

porém não existe forragem ruim, mas sim aquela cultivada em condições inadequadas. Relacionado o cultivo de forragem irrigação, a resposta pode ser satisfatória em todo o Brasil na primavera e verão brasileiro, em condições secas. A condição se refere ao caso de veranicos (curtos períodos sem chuvas no período tipicamente chuvoso) e aos meses de setembro e outubro, que geralmente tem baixos índices pluviais nas condições do cerrado. No outono e inverno, a resposta dependerá muito da espécie forrageira e da região. Recomenda-se utilizar forrageiras que proporcionarão as melhores respostas neste período do ano (Tabela 1).

Tabela 1 - Sugestão geral para grupos de espécies forrageiras de maior resposta aos sistemas de pastejo com irrigação, em função da latitude e altitude.

c) Topografia da área

Uma das principais vantagens do sistema de irrigação, principalmente o sistema por aspersão em malha, e a grande flexibilidade à diferentes formados e topografia do terreno. Porém, como em toda análise técnica, há limites e para cada decisão, há consequências. O custo de implantação e operação do sistema de irrigação será tão mais oneroso quando maior o desnível em aclive e distância entre a fonte de água e o terreno a ser irrigado. 

Não é possível estabelecer limites exatos a partir dos quais podemos afirmar que a irrigação não é viável economicamente, pois como já mencionado, a viabilidade depende de vários fatores, como escala e eficiência de produção, valor agregado do produto, escassez de chuvas, temperatura, subsídios etc. Porém, em termos práticos, não tem se observado a implantação de projetos com desnível total (diferença de nível entre o ponto mais alto e mais baixo do sistema) superior a 80 m. Isto porque além do maior gasto energético para bombeamento, a necessidade de uso de tubos de maior resistência (maior PN – Pressão Nominal) pode elevar demasiadamente o custo de implantação. Quanto à distância da fonte de água, a avaliação deve-se considerar a interação com o desnível. Fontes de água muito distantes, por exemplo, podem ter custo de bombeamento não muito elevado se o desnível total for pequeno, embora o custo inicial com tubulação possa ser relativamente alto.

Sistemas de Irrigação Para Pastagem

A maioria dos sistemas de irrigação disponíveis pode ser utilizada para irrigar espécies forrageiras. Porém, na prática, alguns fatores limitam esta generalização, como custos de investimento e operação do sistema, disponibilidade de mão de obra para operação, topografia, solo, clima, espécie forrageira, presença do animal e questão cultural. No Brasil, a maioria dos projetos de irrigação de pastagem está sendo realizada por aspersão, com o uso de Pivô Central (Figura 2), Aspersão Automatizada (Figura 3) e menor escala temos aspersão com autopropelido e localizada, por Gotejamento.

Figura 2 - Propriedade rural localizada na Colômbia e que possui sistema de irrigação por pivô central para produção animal em pastagem.

Figura 3 - Propriedade rural que possui sistema de irrigação de aspersão totalmente automatizada.

Utilização dos Sistema de Irrigação para Aplicação de Águas Residuárias

As águas residuárias normalmente possui elementos como nitrogênio (N), fósforo (P) e potássio (K) e outros, essenciais para a produção agrícola. Dentre os sistemas de tratamento da água residuária, destaca-se o tratamento biológico e a disposição na forma de fertirrigação. A aplicação de água residuária em pastagem, via sistema de aspersão, pode constituir excelente fonte de adubação, desde que precedida de condições que assegurem a proteção do meio ambiente. 

Estudos comprovam que a aplicação de águas residuárias no solo tem potencial para promover grande melhoria nas suas propriedades físicas, biológicas e químicas. Portanto, sua utilização favorece tanto o produtor, quanto o meio ambiente. O tratamento biológico avançado é de extrema complexidade e custo, sendo ainda passível de problemas operacionais, podendo não ter o rendimento necessário constante, o que pode gerar efluente final ainda em desacordo com as exigências preconizadas pelas normas ambientais vigentes. 

A disposição final da água residuária por fertirrigação (Figuras 4 e 5) é mais segura, mais simples operacionalmente e com probabilidade praticamente nula de se cometer erros operacionais, além de ter custo bem inferior, quando comparado com processos biológicos. Vale ainda destacar que os investimentos necessários para a implantação da fertirrigação também são reduzidos quando comparados com os custos envolvidos na construção de processos biológicos avançados. Outra grande vantagem da fertirrigação é aquela relacionada com a produção forrageira em sistemas de produção de carne e leite ou como biomassa visando à produção de vapor necessário aos processos industriais.

Figura 4 – Empresa localizada no estado do Pará que realiza a correta aplicação via sistema de fertirrigação de toda água residuária produzida para produção de pastagem.

Figura 5 – Exemplo de reutilização de toda água residuária produzida para produção de pastagem. Propriedade localizada no estado do MS.

Referências

APPELT, M. F. Sobressemeadura de aveia e azevém em tifton 85 irrigado sob doses de adubação nitrogenada. 2014. 62 f. Dissertação (Mestrado em Agronomia – Produção Vegetal) – Universidade Federal de Viçosa, Rio Paranaíba - MG, 2014.

ALVES, S.J.; MORAES, A.; CANTO, M.W.; SANDINI, I. Espécies forrageiras recomendadas para produção animal. Londrina: Fundepec, 2008.

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Disponível em: <http://seriesestatisticas.ibge. gov.br/ lista_tema.aspx?op=0&no=1>. Acesso em 03 abril, 2020.