Helena Ferreira Lage é Doutora em Nutrição Animal e Professora Adjunta no Centro Universitário Newton Paiva. Ainda contribuíram com este artigo Ana Luiza Costa Cruz Borges, Professora Associada EV – UFMG e Pedro Araújo Carvalho, Mestre em Nutrição Animal.

Quando o assunto é nutrição da bezerra leiteira, já está bem estabelecido a importância da alimentação de animais em aleitamento baseada no fornecimento de leite e alimentos sólidos (volumosos e concentrados) e água de boa qualidade. 

O fornecimento do leite integral para bezerras em aleitamento é de extrema importância, pois como o rúmen de bovinos muito jovens não está plenamente desenvolvido, a bezerra não consegue aproveitar bem os alimentos sólidos e, portanto, o leite acaba sendo uma importante fonte de nutrientes de energia para estes animais. 

É inegável que, dentre as opções de dieta líquida para bezerras, o leite integral (o mesmo leite que a fazenda vende) seja a melhor delas... Entretanto possui uma desvantagem: o custo elevado. Por isso, é comum vermos em fazendas de leite a adoção de alternativas ao leite integral na nutrição dos animais do bezerreiro. Dentre as opções possíveis na substituição do leite podemos citar o leite de descarte, excesso de colostro, leite de transição e os sucedâneos. Normalmente, todas estas opções apresentam uma vantagem em comum: são mais baratos!

Em relação aos possíveis substitutos do leite integral, muitos estudos já provaram que bons sucedâneos podem substitui-lo totalmente na nutrição da bezerra, sem prejudicar o desempenho, ou seja, vale a pena considerar esta alternativa... A grande questão é: como escolher um bom sucedâneo?

Nem sempre a escolha pelo menor preço é a melhor. Desconfie de sucedâneos muito baratos! A avaliação do rótulo nos fornece informações muito importantes para guiar nossa decisão. No rótulo devemos avaliar duas partes, principalmente: as concentrações de nutrientes e os ingredientes utilizados na fórmula.

A tabela abaixo apresenta os níveis de nutrientes de sucedâneos sugeridos pelo NRC (2001), uma  publicação que define níveis de nutrientes e energia de dietas para gado de leite. Estes valores devem estar contidos no rótulo, podendo ser apresentados em percentual (%) ou em gramas por quilograma (g/kg).

Tabela 1. Níveis recomendados na fórmula de sucedâneos para bezerras leiteiras

Sobre os ingredientes utilizados, é preciso deixar bem claro que sucedâneo não é sinônimo de leite em pó! Trata-se de um produto que pode substituir total ou parcialmente o leite e que possui em sua composição ingredientes de origem animal (derivados do leite ou não) e/ou ingredientes de origem vegetal. Normalmente, é comercializado em pó e requer diluição em água.

Além dos níveis de nutrientes apresentados no rótulo do produto, é importante também avaliar quais são as fontes de proteína e energia (lipídeos e carboidratos). Definir a qualidade de um sucedâneo tem tudo a ver com conhecimento da digestibilidade dos ingredientes, isto é, saber quanto a bezerra digere e absorve em relação aquilo que consome.

As fontes de proteína são o grande foco da pesquisa quando o assunto é sucedâneo. Fontes proteicas na formulação de sucedâneos podem ser de origem animal, como no caso de leite desnatado em pó, proteínas do soro do leite, soro delactosado, proteínas de plasma de sangue bovino ou suíno, bem como de origem vegetal, como proteína da soja ou de glúten de trigo. E qual é a melhor? A caseína presente no leite desnatado é principal proteína do leite e trata-se da melhor opção. Entretanto, pesquisadores apontam que proteína de soro do leite são bem digeridas pelas bezerras e possuem bom perfil de aminoácidos. Proteínas de origem vegetal (hidrolisado de soja, por exemplo) podem ser utilizadas, mas seu fornecimento deve ser direcionado para animais com mais de três semanas de idade, já que animais muito jovens apresentam baixa capacidade de digerir e absorver proteínas que não são derivadas do leite. Normalmente, a inclusão de proteínas não-lácteas na fórmula reflete na fabricação de sucedâneos mais baratos.

A tabela abaixo apresenta a classificação de possíveis fontes de proteína utilizadas na formulação de sucedâneos feita pelo Dr. Drackley, uma autoridade mundial quando o assunto é criação de bezerras.

Tabela 2. Classificação das fontes de proteína utilizadas na formulação de sucedâneos

Carboidratos e lipídeos são adicionados aos sucedâneos como fonte de energia e em ambos os casos, é importante verificar no rótulo quais são as fontes utilizadas. 

Bezerras jovens apresentam baixa capacidade em digerir carboidratos, com exceção da lactose, que é o carboidrato naturalmente presente no leite. A lactose é o principal carboidrato em sucedâneos e não é indicada sua substituição total por outras fontes. Normalmente, sua inclusão se dá pela adição de leite desnatado, soro de leite em pó ou pela sua adição em sua forma “pura” na fórmula do sucedâneo.

Sacarose e amido (carboidratos de origem vegetal) podem ser incluídos na formulação de sucedâneos. Entretanto, devemos frisar que são menos aproveitados, já que a bezerra muito jovem não produz enzimas suficientes para digerir estes ingredientes com eficiência. A sacarose pode ser identificada pela inclusão de açúcar na fórmula. Já a presença de amido pode ser identificada pela inclusão de ingredientes como farinha de trigo, milho ou outros cereais. 

Quando incluído, é desejável que o amido tenha sofrido algum tipo de processamento para aumentar sua digestibilidade. Tais processamentos podem promover a gelatinização do amido e podem ser mencionados nos rótulos, como milho gelatinizado, por exemplo.  Excesso de amido na formulação de sucedâneos é indesejável e normalmente isto pode ser identificado pelo maior percentual de fibra nos níveis de garantia do produto. 

Normalmente, a inclusão de ingredientes de origem vegetal aumenta o teor de fibra da fórmula e isso, consequentemente reduz a quantidade de energia que o sucedâneo fornece. Por isso, nos rótulos vemos o valor de fibra máximo que a fórmula contém, uma vez que o aumento no percentual da fibra pode reduzir o desempenho dos animais no bezerreiro. Níveis máximos de fibra devem oscilar entre 0,15% e 0,20%.

No caso de gorduras, a gordura do leite seria sem dúvida a melhor opção, não fosse pelo alto valor de mercado. Sendo assim, a adoção de substitutos torna-se necessária para baratear a fórmula do sucedâneo e assim, tornar a sua utilização interessante. Gordura de côco ou gordura de palma são fontes aceitáveis para substituição. Gorduras de origem animal como sebo bovino ou gordura são mencionadas como boa opção na literatura científica mais antiga. Óleos vegetais convencionais, como óleo de milho ou soja, não são bem aproveitados pelas bezerras (com exceção do óleo de canola).

Outro aspecto a ser considerado é que alguns sucedâneos apresentam em sua fórmula melhoradores de desempenho, como anticoccidianos, prebióticos, probióticos ou ácidos orgânicos, que podem ajudar no controle de diarreias.  Para acertar na escolha do produto, temos que ter em mente que tudo vai depender do objetivo da fazenda. Por isso, ao tomar uma decisão sobre qual sucedâneo adotar na propriedade, é muito importante que o veterinário ou zootecnista parceiro possa esclarecer as dúvidas juntamente com o produtor. 

Atenção a outros detalhes também muito importantes... 

ÁGUA: como o produto requer diluição antes do fornecimento para a bezerra, tenha atenção para a qualidade da água utilizada A água utilizada na preparação do sucedâneo deve ter a mesma qualidade da água que você consome e muitas vezes isso é deixado de lado na fazenda. Não adianta fornecer o melhor sucedâneo do mercado, se a água utilizada for suja ou muito contaminada! 

HIGIENE: cuidado com a higienização dos utensílios utilizados no preparo do sucedâneo é fundamental para garantir a qualidade do alimento.

RECOMENDAÇÃO DO FABRICANTE: SIGA À RISCA! Respeite a quantidade de produto e de água a serem utilizadas, temperatura da água na diluição etc. Um sucedâneo de boa qualidade e bem preparado não deve apresentar grumos ao final do processo de preparação, devendo estar totalmente solubilizado. Garanta que a mão de obra responsável pelo fornecimento das bezerras esteja ciente disso e esteja disposta a trabalhar bem nesse sentido. 

É fundamental que ao adotar uma mudança na dieta das bezerras haja acompanhamento sobre a aceitação do produto pelos animais (se o animal tem vontade de mamar ou não), do desempenho (ganho de peso) e possíveis alterações de saúde, como a ocorrência de diarreias. Você pode começar fornecendo para alguns animais e, de acordo com a resposta obtida, decidir pela adoção ou não do sucedâneo na propriedade. “Escute” o que as bezerras têm para “falar” a respeito da alteração da dieta! 

E aí? Com base no que você sabe agora, adotaria sucedâneo na alimentação de suas bezerras?