Artur Chinelato de Camargo atua na área de Pesquisa e Desenvolvimento na Embrapa Pecuária Sudeste em São Carlos/SP, é idealizador do Programa Balde Cheio, que ganhou notoriedade pelo Brasil afora por proporcionar a produtores e técnicos o acesso às tecnologias disponibilizadas por vários meios de pesquisa. Artur esteve em Luz/MG no dia 25/07, em visita as propriedades assistidas e concedeu uma entrevista exclusiva, expondo seu ponto de vista sobre os gargalos e futuro da pecuária leiteira.

Com foco em capacitação de técnicos, o programa promove o desenvolvimento da pecuária leiteira e contribui para tornar as pequenas propriedades sustentáveis e mais rentáveis. Atualmente, o Balde Cheio está em 13 estados brasileiros, com cerca de 200 técnicos em treinamento e mais de 1.200 propriedades assistidas em todo o país.

Confira agora como foi a entrevista com o pesquisador e idealizador do Programa concedida ao coordenador do Balde Cheio Luz Guilherme Oliveira.

Existe hoje no Brasil vários sistemas de produção, desde os extensivos até o Compost Barn. Qual a sua visão sobre esses avanços?

A pecuária no Brasil tem um enorme potencial, prova disso é o quanto poderemos aumentar a produtividade nas fazendas. Tem de se ter a convicção de que é preciso fazer o básico na maioria das propriedades leiteiras. O básico ao que me refiro é fornecer alimentação volumosa em qualidade e quantidade suficiente, além de conforto, bem-estar e saúde no rebanho. Portanto, a primeira premissa é fazer o básico, não precisa inventar, basta trabalhar para que o negócio dê resultado, de forma simples.

Em relação ao pastejo rotacionado. Ainda vemos alguns produtores discutindo se é viável ou não. Chegam a dizer que a silagem compensa mais. O que o senhor pensa sobre isso?

O pastejo rotacionado é muito antigo, ele veio de uma derivação do pastejo Voisin, que foi criado na França na década de 60 e trazido para o Brasil. O problema é que o Voisin não premiava a pastagem com adubação de reposição. Com isso, a pastagem foi se degradando até acabar. Ela durava um tempo curto. O pastejo rotacionado premia a pastagem com a reposição de nutrientes. No entanto, não é fácil, você tem que cuidar da pastagem como se fosse uma cultura e tem muitos produtores que não lidam com a pastagem como cultura e sim, de forma extrativista. O produtor, além disso, precisa entender da interação da pastagem com o animal. Não tenho dúvida de que silagem é um bom volumoso, mas se deve tomar cuidado, se você comparar o custo da MS (materia seca) da silagem e da pastagem, vai ver que o pasto lhe dá mais oportunidade de retorno. Tem muita gente boa por aí dando silagem para vacas com baixa produção, inviabilizando cada vez mais a atividade e por outro lado tem produtores não manejando bem a pastagem dizendo que a tecnologia não funciona. Ainda temos muito a aprender, o principal objetivo do Balde Cheio não é sair dizendo que todo mundo deve ou não usar silagem, nosso principal objetivo é fazer o produtor de leite ganhar dinheiro.

O pastejo rotacionado já atingiu o seu auge nas fazendas modelos? Ou ainda conseguimos produzir mais forragem por área?

Ainda não dá para saber se conseguimos alcançar o auge dos resultados quando nos referimos ao pastejo rotacionado. Tem propriedades do Balde Cheio onde atingimos lotações de 10, 12, 15 vacas por hectare, mas não sabemos se isso é o limite, sabemos que temos condições muito boas para explorar o potencial de nossas pastagens, inclusive pelos quatro cantos do nosso país. Cada produtor deve encarar a implantação de um sistema de pastejo rotacionado como um desafio, fertilidade é a base de tudo junto com um bom manejo. A fertilidade não se constrói da noite para o dia, os resultados (maiores lotações) vão ser alcançados em longo prazo. Os técnicos que atuam no Balde Cheio precisam ter o espírito de um pesquisador e aproveitar a pastagem para fazer tratamentos diferenciados explorando melhor os recursos disponíveis e as várias pesquisas já desenvolvidas. Temos que aprender a buscar a excelência e uma eficiência cada vez melhor.

Além do quadro reprodutivo, a Embrapa está trabalhando em algum outro software ou aplicativo de gestão de rebanhos leiteiros?

A Roda da Reprodução é um dos aplicativos mais acessados e utilizados da Embrapa, hoje com mais de 16 mil usuários permanentes. A ferramenta permite acompanhar o crescimento e o peso das novilhas e das bezerras, além de monitorar de maneira simples os estágios produtivos e reprodutivos das vacas. Note-se que é baixado gratuitamente. Muitas pessoas ainda não conhecem o aplicativo, imagine 16 mil usuários num universo de 1,2 milhões de produtores de leite, a porcentagem é muito pequena. Atualmente ele só está disponível no sistema Android. A deficiência está no fato que o aplicativo ainda não está disponível para o iPhone. Se você pesquisar nas lojas virtuais você vai encontrar um outro aplicativo da Embrapa chamado Gisleite. O GisleiteApp é um aplicativo para dispositivos móveis (smartphones ou tablets) da plataforma Gisleite (Gestão Informatizada de Sistemas de Produção de Leite), desenvolvida pela Embrapa Gado de Leite. O seu objetivo é facilitar a coleta de dados nos sistemas de produção, inclusive em locais sem disponibilidade de acesso à Internet. As principais funcionalidades incluem o registro de coberturas, registro de diagnósticos de prenhez, registro de partos/nascimentos, registro de controle leiteiro, registro de encerramento de lactação, registro de pesagens, registro de movimentações e consulta a relatórios.

Quais os indicadores zootécnicos o senhor considera mais importante para a produção de leite?

São vários, mas os mais importantes são a porcentagem de vacas em lactação (ideal igual a 83%), porcentagem de vacas no rebanho (ideal acima de 60%), porcentagem de vacas em lactação no rebanho (ideal acima de 50%) e a quantidade de vacas em lactação por hectare (acima de 1,5 VL/ha). Esse último, envolve tanto a eficiência agronômica no que diz respeito a produtividade de pastagens, culturas, cana-de-açúcar, milho para silagem, sorgo para silagem, campos de feno e outros, como também a eficiência reprodutiva do rebanho (composição e estruturação de rebanho). Esses são indicadores que avalio como muito importantes para a garantia de melhores resultados. Veja que eu não citei a média de produção das vacas em lactação. Esse é um índice importante, mas não é essencial para que eu avalie se a propriedade está indo bem ou mal, ele é componente de outro grupo de índices zootécnicos. Gosto muito de ressaltar que é preciso fazer gestão, pois, o que mais importa é que o produtor tenha renda na sua atividade. Não podemos encarar a pecuária de leite como uma receita de bolo, só porque dá certo para um não quer dizer que pode dar certo pra outro. Cada propriedade tem suas peculiaridades.

Qual sua visão para o futuro da Pecuária Leiteira no Brasil?

Essa é uma pergunta que nos faz sonhar e vislumbrar o amanhã. Se o produtor tiver uma assistência técnica capacitada, ele vai ter futuro, se não tiver uma assistência técnica auxiliando-o aí vai ser muito difícil de sobreviver nesse cenário de competição, então, é fundamental que ele busque o auxílio de profissionais que possam lhe dar um bom suporte, independentemente de sua situação financeira, do tamanho da propriedade, da qualidade do rebanho, da disponibilidade ou não de recursos financeiros. O produtor precisa encontrar um técnico que enxergue potencial na propriedade dele e que proponha soluções e que cada um possa desempenhar bem o seu papel. Gosto muito de reforçar isso, existe no Brasil atualmente vários projetos voltados a assistência técnica e esses são de fundamental importância para ajudar o produtor a vencer os desafios de uma atividade complexa. Ressalte-se que o Balde Cheio não é um projeto de assistência técnica, ele é um projeto que capacita os técnicos para prestar assistência técnica, então, estamos trabalhando com os técnicos, não com os produtores, claro que os produtores acabam sendo beneficiados, mas o foco principal são os técnicos. Portanto, a minha visão de futuro para a pecuária leiteira no Brasil está no acompanhamento e na gestão compartilhada entre técnicos e produtores.