Este é um trecho do Capítulo 19 do livro “Diferentes Abordagens sobre Agricultura Irrigada no Brasil”, Técnica e Cultura, lançado em 2021. Autores: Luís César Dias Drumond, Fernando Campos Mendonça, André Santana Andrade, Maicon Fábio Appelt e Danielle Morais Amorim.

Em sistemas para gado de corte, os principais fatores responsáveis pela variação do resultado econômico são o preço de compra de animais de reposição e o preço de venda de animais, tanto em sistemas de recria quanto de engorda. Diferentemente do senso comum do produtor rural, a irrigação não é uma tecnologia cara. Nos investimentos em sistemas de produção pecuária intensiva em pastagens fertirrigadas, a aplicação total de capital na terra, em média, é de aproximadamente 40 a 50 mil reais por hectare (R$ ha-1) para gado de corte, enquanto varia de 60 a 70 mil para gado de leite. Essa aproximação refere-se a todo investimento (irrigação, cercas, infraestrutura, animais, e energia elétrica, principalmente), sendo que deste total aproximadamente 30 a 40% refere-se ao sistema de irrigação em sistemas para gado de corte, ao passo que 20 a 30% seria uma proporção aproximada para sistemas para gado de leite.

Todo esse investimento é devido à complexidade do sistema de produção animal a pasto, que é composto por três etapas principais: crescimento, utilização e conversão. Observa-se que a irrigação atua juntamente com outros fatores, como a adubação e as condições climáticas para a produção vegetal, que em conjunto são apenas uma das etapas de produção. 

Para que o investimento na primeira etapa (crescimento) resulte em retorno econômico, é necessário estar atento às demais etapas (utilização e conversão), o que implica em eficiência de utilização da forragem produzida. É necessário que os animais consumam o máximo possível da forragem produzida, para que o desperdício não anule o aumento da produção. Nesta etapa atua, principalmente, o manejo do pastejo. Adicionalmente, a forragem consumida deve ser eficientemente convertida em produto animal. Isso significa que o animal deve ganhar peso ou produzir leite, e nesta etapa também atua o equilíbrio nutricional da forragem e da dieta, e o mérito genético dos animais. 

Além de a irrigação ser um dos fatores de aumento da produção vegetal devido ao suprimento de água, ela também interfere em outros fatores de custo de produção. Destacam-se a redução da compactação e danos às forrageiras causados por máquinas, e a possibilidade de aplicação de fertilizantes via equipamento de irrigação (fertirrigação), que reduz os custos de aplicação e aumenta a eficiência de uso dos nutrientes. 

O uso da fertirrigação também otimiza o uso da terra – que tem valorização crescente – e da infraestrutura do sistema de produção, pois aumenta a segurança e a flexibilidade do sistema de produção em termos de mercado, aumenta da escala de produção e possibilita adquirir e vender animais em períodos variados do ano. No sistema de produção de carne, permite firmar contratos com frigoríficos, com valorização da carcaça produzida. 

O uso da fertirrigação em pastagens tem função mais importante que a simples aplicação de água à pastagem. Estimula o produtor a fazer adubação, a manejar melhor a fertilidade do solo e a pastagem, investir em tecnologia, otimizar o uso de recursos naturais e incrementar o planejamento de seus investimentos. Assim, colabora para aumentar a esperança de sucesso da atividade pecuária. 

Nossa experiência no trabalho com irrigação e fertirrigação em pastagens permite observar que a avaliação de sua viabilidade nas várias regiões brasileiras devem levar em consideração as características climáticas, principalmente temperatura e precipitação pluvial. Para haver resposta satisfatória à irrigação é necessário que a temperatura permita o crescimento da espécie forrageira de interesse. Entretanto, além do clima há outros fatores que devem ser levados em consideração: espécie forrageira utilizada, tipo de solo, características topográficas (forma e relevo da área), disponibilidade e distância da água à área, disponibilidade e fonte de energia elétrica, valor agregado da produção, eficiência da unidade produtiva, intensidade de uso e valor da terra, custo de alimentos suplementares, questões operacionais da fazenda, mercado de animais, afinidade do produtor com a atividade, e subsídios do governo

Muitos trabalhos científicos avaliaram a viabilidade da irrigação de pastagem, porém, geralmente os trabalhos não consideram todos esses fatores. Assim, a tomada de decisão deve ser mais ampla. A depender da situação, a fertirrigação de pastagem pode, ou não, ser viável em qualquer região do Brasil. Por isso, a interpretação sobre tal viabilidade deve ser tomada com o devido conhecimento sobre o tema e sistemas de produção. 

Para as forrageiras tropicais mais comumente utilizadas em áreas irrigadas (Panicum, Pennisetum, Cynodon e Brachiaria), a resposta é diretamente proporcional ao período em que há temperaturas altas e ausência de chuvas. Espécies adaptadas a clima temperado (Ex.: aveia, azevém, etc.) apresentam resposta satisfatória à irrigação em períodos de frio e seca do Brasil. Na maioria da área das regiões Sudeste e Centro-Oeste, os períodos seco e frio coincidem. Nessas condições é importante considerar a temperatura basal inferior das espécies utilizadas e utilizar estudos de modelagem do crescimento de plantas forrageiras, principalmente os que utilizam a associação entre produção de forragem e o acúmulo de graus-dias de desenvolvimento (GDD). 

Na irrigação de pastagem a condição física dos solos é de extrema importância, devido à alta carga animal. Na época de chuvas, solos muito argilosos podem apresentar problemas no manejo. Assim, muda-se alguns conceitos, pois corrigir a fertilidade de um solo geralmente tem custo inferior ao da implantação de um sistema de drenagem. Exceto em solos salinos, os atributos químicos assumem importância secundária, visto que na maioria das vezes é possível a correção de problemas como acidez e concentrações tóxicas de alumínio e manganês por meio de corretivos (calcário, silicatos, óxidos, hidróxidos, entre outros) ou de adubação. 

É possível afirmar que, para sistemas altamente intensivos, solos com textura média a grosseira (arenosos) são mais adequados a sistemas de produção com fertirrigação, devido à menor formação de áreas encharcadas e barro, especialmente em áreas de lazer, ao redor de cochos e bebedouros, e em corredores de acesso. O monitoramento de elementos químicos e práticas de manejo devem ser ajustados em função das características do solo. 

Não é recomendada a irrigação de pastagens em solos mal drenados e/ou com probabilidade de alagamento em alguns períodos do ano. Tal fato se deve às limitações ambientais ao uso de adubação intensiva, à necessidade de uso de espécies tolerantes específicas – que podem não ser as mais recomendadas para altos níveis de produção – e às complicações operacionais e de manejo no período chuvoso. Novas variedades vêm sendo desenvolvidas e estudadas para tais áreas (Ex.: Panicum PM455) e o avanço das pesquisas devem levar a mudanças em breve. 

Com relação ao local de instalação do equipamento, deve-se considerar a distância e o desnível do ponto de captação de água à área irrigada. Em situações de grande distância ou desnível elevado, pode-se projetar um reservatório em um ponto previamente estudado e fazer uma avaliação econômica do projeto. Tal alternativa é particularmente interessante quando há limitações de água e/ou energia elétrica, que são situações muito frequentes, pois pode-se bombear para o reservatório por um período de até 21 h dia-1 e irrigar durante a noite. Isto resulta em aumento da área irrigada e redução do custo de energia dos sistemas de fertirrigação. 

O processo de implantação e utilização da irrigação e fertirrigação em pastagens demanda conhecimento técnico adequado em todas as fases (projeto, implantação, uso e avaliação de desempenho técnico e econômico). Por isso, é importante que haja um esforço contínuo, em escala nacional, para o treinamento e a capacitação de profissionais ao trabalho com a produção animal em áreas irrigadas. Embora tal iniciativa já seja tomada por diversas instituições brasileiras, ainda pode ser aprimorada por meio do estabelecimento de indicadores de performance e eficiência de sistemas de irrigação e fertirrigação. Qualquer sistema de produção deve ter acompanhamento técnico de profissionais da área. Quanto maiores o profissionalismo aplicado e a busca de conhecimento (como visitas em áreas de sucesso), maiores as chances de sucesso de um projeto.